terça-feira, 30 de setembro de 2008

LOST!


Tenho um profundo sentimento de perda por ver limitado o meu direito de liberdade de expressão, mas não me posso hoje dirigir ao leitor deste post com tudo que me apetece realmente dizer. Ainda assim, nada me impede de constatar uma evidência. Como quem acompanhou os primórdios deste blog bem sabe, encontro-me a finalizar (espero bem...) o meu estágio. A decisiva e derradeira prova de fogo deste estágio consiste numa prova oral, com um tema previamente seleccionado e SUMARIADO. Dei cumprimento a todos os requisitos legais exigíveis e fui admitido a realizar a mais que esperada derradeira prova de fogo. Mas hoje, 30 de Setembro de 2008, aqueles que irão aferir da minha competência para exercer a profissão, informaram-me, em traços breves e linguagem simples, que PERDERAM O MEU SUMÁRIO, O MEU TEMA DA ORAL! Aprecio a frontalidade, onde quer que ela se encontre. Mas o que mais me fascina no meio de todo este circunstancialismo é o perder algo de vital importância para o interessado, assim, como quem perde uma moeda de 1 euro ao tirar o dinheiro dos bolsos para comprar o bilhete do autocarro... Foram, aproximadamente, 50 páginas que se perderam e que foram elaboradas com uma diligência e sentido de responsabilidade quase impossíveis. Estou felicíssimo com tudo o que aconteceu.
Resumindo, mais vale limitar o meu direito de liberdade de expressão. Não dizer tudo aquilo que quero dizer e que merecem ouvir ou ler. Pelo menos, enquanto a "faca e o queijo" estiverem nas mãos do lado de lá... Causará sempre maior impacto deixar algo no ar. E sempre é preferível a dizer a verdade "em lume brando", numa condescendência que seria por demais lisonjeira para quem merecia ouvir algo mais...
Perdoem-me o cliché, mas "é o país que temos"!

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

ATÉ QUANDO, ATÉ QUANDO!!!

O Senado Romano em 63 a.C. A denúncia de Catilina por Cícero, o célebre discurso

"Qvosque tandem abvtere, Catilina, patientia nostra?"

Uma tradução fiel da citação apresentada supra revela-nos um "Até quando, Catilina, abusarás de nossa paciência?". Era esta a designação que tomaria o discurso proferido por Cícero, cônsul romano, no intemporal Senado em Roma, no ano de 63 a.C., discurso dirigido a Lucius Sergius Catilina, há época seu arqui-rival na nomeação para o prestigiado cargo político. A história, contada simples, diz-nos que Catilina foi questor, pretor e governador de África até 64 a.C., data em que cobiça o verdadeiro poder político, vulgo, o de cônsul, e encontra como adversário Cícero, que leva a melhor nesta corrida ao poder. Surgem então as inimizades entre ambos, com acusações de tentativas de assassinato incluídas, até ao monumental discurso de Cícero, com o título referido, que selaria o estatuto de persona non grata de Catilina perante o Senado, obrigando-o a exilar-se e a refugiar-se em planos votados ao insucesso para matar Cícero, o cônsul eleito. Este discurso, não descurando a sua dignidade e prossecução de objectivos marcadamente políticos, constitui uma obra-prima de retórica e um exemplo sublime de discurso argumentativo. Por isso e por muito mais, Cícero é um dos primeiros políticos da História do mundo Ocidental e uma referência enquanto tal. Era assim Cícero: um cerebral...

Sucede que Cícero e o seu discurso padeceram de um pequeno e descomunal azar: o de Lucius Sergius Catilina se chamar Catilina e não TERESA GUILHERME. Seria um condimento perfeito que conferiria ao discurso aquela gota de vanguardismo e perpetuidade... Em 1991 fui a um concurso de televisão. No "Senado" da Produção do concurso, Teresa Guilherme tinha levado a melhor na corrida ao poder. Na altura, com 10 anos de idade, o meu poder de decisão era diminuto. Por decisão dos meus pais, sempre sábios e sensatos (como Cícero...), fui a esse concurso porque seria uma experiência positivamente marcante, muito instrutiva e enriquecedora. E foi mesmo, se me abstrair do facto de que estive a menos de 1 metro da Teresa Guilherme, da sua arrogância e má formação. São 3 décadas de Teresa Guilherme, de sua intervenção activa, ainda que intermitente, no panorama televisivo em Portugal. São 3 décadas do pior que já foi feito em televisão: "Ai os Homens", "Furor", "Big Brother", "Rosa Choque", "Floribella" e "Chiquititas" são realidades puras de desmedida mediocridade no serviço público de televisão e todas tiveram o cunho pessoal, a assinatura de Teresa Guilherme. Surge agora o "Momento da Verdade". Sinceramente, porque julgo estar a dirigir-me a intelectos com o mínimo de massa crítica, escuso-me a tecer grandes considerações sobre a nova "jóia" de Teresa Guilherme. Digo apenas que continuarei a lembrar o "Momento da Verdade" como um grande filme, do Karaté Kid, do Daniel-San e do Mr. Mhyagi, em que o protagonista acaba sempre por ficar com a "gaja" de 12/15 anos no final, em que não há sexo, não há grande sangue e, acima de tudo, não há "lixo" e mediocridade. Enfim, prefiro lembrar o "Momento da Verdade" como algo que tenha marcado uma geração. A minha geração. Ainda que a Teresa Guilherme também a tenha acompanhado. E por tudo isto, 3 décadas de Teresa Guilherme em televisão é merecedor de que se questione "até quando abusará ela da nossa paciência?". É uma afronta aos meus direitos enquanto espectador, cidadão e, porque não, contribuinte...

Resta assim concluir, dizendo que Catilina conheceu a sua morte enfrentando o exército do Senado, que lhe reconheceria a sua bravura. O paralelismo impõe-se e pouco me importa que se reconheça bravura na "obra" de Teresa Guilherme. Preponderante, é que a sua "morte televisiva" ocorra rapidamente... Até pode ocorrer frente-a-frente, sem golpes nas costas, tal como Catilina. Pode até ser com um golpe fatal desferido pelo Karate Kid, no tal "Momento da Verdade". Mas o que me interessa MESMO é vestir a pele de Cícero e desejar que a Teresa Guilherme deixe, de uma vez por todas, de abusar da minha paciência...
AMPLEXO

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

FELIZ ANIVERSÁRIO


Esta noite bebi uma taça de champagne em honra de alguém muito especial. Foi o 64º aniversário do meu pai. Está, por isso, de parabéns. É um grande homem e tem "obra" feita, como é o seu rico filho... Por esta razão - e muitas outras mais - hoje é o dia em que a obra presta homenagem ao seu autor. Para isso, essa obra utiliza este blog como veículo para homenagear alguém que merece muito crédito, todo o crédito até. Assim sendo,
BOA COTA! JÁ VAIS NAS 64 TAÇAS DE CHAMPAGNE... CONTINUA A SER HOJE O MESMO DE SEMPRE: RIJO!
PARA O ANO CÁ ESTAREI, OUTRA VEZ, A CONTAR AS TUAS TAÇAS DE CHAMPAGNE...
AQUELE AMPLEXO

terça-feira, 23 de setembro de 2008

GARRAIADAS...


Começo a padecer de alguns sintomas que me sugerem estar a caminhar, em jeito galopante, para a terceira idade. A par de uns quantos charmosos cabelos brancos que me vão aparecendo pela região capilar, deparo-me agora com a incapacidade de situar determinados episódios e momentos nas devidas circunstâncias de tempo e lugar. Porém, se no devido tempo era da opinião que a Garraiada era o evento mais fascinante da Queima das Fitas em Coimbra, ainda hoje perfilho esse entendimento. A assustadora incapacidade de "localizar" temporalmente as minhas noites de Queima enquanto estudante, não só nos dias mas, até, nos anos, é um dado adquirido. Não se duvida. Mas hoje, enquanto percorria a pé aqueles metros até ao Estádio D. Afonso Henriques, tive o privilégio da companhia do Pedro, irmão do meu amigo João Ildo, e logo me recordei da minha última Garraiada enquanto estudante, ou seja, a do ano de 2004. Porque é que me recordo desta? Pois bem, se assim é... acompanhem-me por favor.

Nos meus tempos académicos, ainda precedentes da reforma de Bolonha, a Garraiada era ao Domingo na simpática localidade costeira da Figueira da Foz. O espírito da Garraiada consistia pois na saída do Parque da Queima directamente para a estação de comboios, com destino à Figueira, num comboio gratuito e com 3 dúzias de gente embriagada por cada 2 metros quadrados. Não me esquecerei muito facilmente daqueles que iam até à Figueira só com as pernas dentro do comboio, ou de aqueloutros que aproveitavam para descansar um pouco, deitados sobre as barras de metal que servem para pôr as malas, por cima dos bancos do comboio, tipo carnes expostas no talho. Nesse ano de 2004, encontrei, ainda no Parque, na noite de Sábado para Domingo, o Pedro, irmão do meu amigo Ildo. Combinámos, já de manhã, ir à Garraiada no tal "comboio embriagado". Pedi-lhe meia-hora para ir a casa trajar-me a rigor, maxime, vestir o trajo académico. Ele anuiu. Assim, ainda em casa e já trajado a preceito, resolvi ligar ao Pedro, irmão do meu amigo Ildo, averiguando por onde andava. Percorri o "p" da lista telefónica do meu telemóvel até chegar ao "Pedro Ildo". Premi a tecla verde e estava prestes a iniciar a conversação. Apercebendo-me que, do outro lado da linha, o outro interlocutor também havia premido a tecla verde (do seu telemóvel, claro), de imediato soltei o seguinte cumprimento: "Como é, filho da puta?". Para as almas menos "anortizadas", impõe-se aqui um breve esclarecimento. A expressão por mim utilizada ("filho da puta") chega, por mais estranho que possa parecer, a nem ser palavrão. Partindo do pressuposto que a conversa iria decorrer entre 2 nortenhos, o uso do vernáculo descrito daria origem a um início excelente. Se juntarmos o facto de os 2 intervenientes serem, não só nortenhos como também vimaranenses, o uso da referida expressão demonstra ainda que a conversa não poderia ter começado com maior afecto ou harmonia. Em suma, foi aquele "filho da puta" que todos dizemos quando ouvimos uma conferência de imprensa do José Mourinho - é, pois, a expressão verbal mais condizente com um estado de honesta admiração.

Pelo descrito se influi que a conversa fluia serenamente, tal qual como no Reino da Dinamarca. Tudo graças àquele "como é, filho da puta?". Até que, a esta pergunta surgiu a resposta, lá do outro lado da linha. E a resposta foi "Rica???". Durante milésimos de segundo não reconheci a voz do outro lado. Findos esses milésimos de segundo, a harmonia e o afecto que deram início à conversação viriam a sofrer uma pequena nuance: a constatação de que, do outro lado da linha, o interlocutor não era afinal o Pedro, irmão do meu amigo Ildo, mas sim o seu PAI (do Pedro e do meu amigo Ildo)! Afinal, o número que eu tinha no meu telemóvel não era do Pedro, mas sim do seu pai... Tudo bem que o seu pai também seja vimaranense, mas "anortizar" assim a conversa com o primeiro homem que me viu nú (era o meu pediatra, leia-se...), era um exagero maior do que os explosivos manuais fabricados pelo Macgyver com uma chave de fendas, um fósforo e um maço de tabaco...

Vi-me assim "com a cabeça na guilhotina". Restava-me operar todos os esforços possíveis para não fazer "soltar a lâmina que me cortasse o pescoço". As hipóteses à vista seriam:


1- Tentar justificar o injustificável, caindo num rol de infrutíferas explicações sobre a "nortização" do conceito de "filho da puta";


2- Em busca do primeiro objectivo, tentar exprimir-me de alguma forma, uma vez que eram 7 e tal da manhã e eu tinha bebido um "camião" de álcool;


3- Na sequência do segundo objectivo, tentar não emitir sons estranhos, tais como o "enrolamento" de algumas palavras de dicção mais exigente, como se estivesse a vomitar.


Perante este campo de decisão, optei por... nenhuma delas! Ao invés, e instintivamente até, premi de imediato a tecla do meu telemóvel do lado oposto àquela verde, que havia dado início a esta conversação agora menos afectuosa ou harmoniosa: a tecla vermelha. Quebrei, portanto, aquela conversa. Agora com um dado novo: em vez de me preocupar em não fazer soltar a lâmina que me cortasse o pescoço, coloquei-me num estado em que desconhecia se havia feito soltar essa lâmina ou não. Tanto melhor assim. E até agradecia morrer ignorante neste capítulo... E no momento seguinte a este quebrar de conversação soltei um "Foda-se!!!". Para logo de seguida ficar a olhar fixamente para o meu telemóvel, incapaz de soltar uma palavra. Mas centremo-nos nesse "foda-se". Também aqui, para os menos "anortizados", esta expressão chega a nem ser um palavrão. Ponderadas as atenuantes de stress e vergonha impulsionadas pela situação descrita, o uso do referido vernáculo tem o intuito de ilustrar verbalmente um momento verdadeiramente marcante da existência de quem o profere, ao ponto de o próprio (o momento) se eternizar. Em suma, foi aquele "foda-se!" que todos dizemos ao vermos a cena épica de sexo entre Halle Berry e Billy Bob Thornton em Monster's Ball, ou a notável performance de Scarlett Johansson em Match Point - é, pois, a expressão verbal mais condizente com um estado de franca admiração.

Resta pois saber o desfecho da estória. Neste tocante, diga-se que o pai do Pedro, e do meu amigo Ildo, resolveu ligar a este último. Perante a chamada, o meu amigo Ildo decidiu atender. Do outro lado, o seu pai atirou: "Porque é que o Rica me ligou a esta hora?". O meu amigo Ildo, ao premir a tecla verde do seu telemóvel, colocou a sua cabeça na guilhotina... Cumpria-lhe fazer de tudo para que não se soltasse a lâmina que lhe cortasse o pescoço. A saber:


1- Tentar justificar o injustificável, uma vez que ele não sabia "puto" do que se tinha passado;


2- Em busca do primeiro objectivo, tentar exprimir-se de alguma forma, uma vez que eram 7 e tal da manhã e ele tinha bebido 2 "camiões" de álcool;


3- Na sequência do segundo objectivo, tentar não emitir sons estranhos, tais como o "enrolamento" de algumas palavras de dicção mais exigente, como se estivesse a vomitar.


Perante este campo de decisão, o meu amigo Ildo, ao invés de mim, optou pela segunda hipótese. Pelo meio, incorreu na terceira. E com isso, fez soltar definitivamente a lâmina, que lhe cortaria o pescoço...


Um forte AMPLEXO

terça-feira, 16 de setembro de 2008

SONHOS E MIRAGENS


Em tempos assim não tão longínquos, desci pelo elevador de minha casa até ao quiosque em baixo. Deparei-me, como em outros incontáveis dias, com a Camy atrás do balcão (o ipselone ou i grego, confere uma conotação ao nome bem mais fidedigna com a personagem em causa, bem melhor que um simples "i"...). Naquele tempo, o concurso do Euromilhões conhecia ainda os seus primeiros sorteios. Por isso, a febre de apostas era bem alta e o concurso dominava os temas de conversa nos cafés e praças deste país, ou não vivessemos nós na "nação do dinheiro fácil e de menor esforço". Por conseguinte, seguindo-se ao triste fado do infortúnio por nunca se ser o felizardo do cobiçadíssimo prémio primeiro - como se este tivesse, obrigatoriamente(!), de sair a quem tem o simples acto de jogar - surgiu no quiosque o inevitável "tratado" sobre "o que faria eu se me saísse o euromilhões?". Pois bem, a dita Camy proferiu os seguintes escritos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos: "Ai, a mim se me saísse, ia já uma semana pro Algarve!"... Ora bem... Como dizer isto de uma forma, digamos, simpática? O melhor que consigo, e o que me apraz dizer, é que consigo passar com relativa indiferença por horizontes manifestamente... curtos. É que nem está em causa o facto de não se conhecer o Algarve, por escassez de posses. Porque a referida personagem deste post até goza férias no Algarve quase todos anos com os seus, como estes (os seus) fazem bem questão de "informar a comunidade em boa voz". Talvez haja gente com hábitos enraízados, não sei. Sei, isso sim, que este "imperativo algarvio", juntamente com aquele sonho de "se me saísse o euromilhões, construia uma vivenda e montava um café por baixo para me ocupar", enxertam na contemplação do prémio milionário um rasgo de inegável genialidade...
Isto posto, é hora de revelar o meu próprio "tratado" sobre a matéria. Assim sendo, que faria eu se me saísse o Euromilhões? Assim de repente, penso que compraria uma casa em Praga. É, é isso mesmo, comprava um apartamento no centro de Praga. Gostava de ter a sorte de poder contemplar a Stare Mesto, ou centro histórico, sempre que me apetecesse. Gostava de "fazer parte" de um local a que já fui em 3 ocasiões. Tudo porque estou a falar-vos de uma cidade realmente inspiradora. Tenho a sorte de manter o contacto com a Simona e com a Ivana, amizades que advêm dos meus tempos de Erasmus. Ainda bem que a distância que nos separa se resume ao mero aspecto geográfico da coisa. Porque são amizades para a vida e porque assim fui o "feliz contemplado", tal como no Euromilhões, com a descoberta de Praga tutelada por duas locais. Fiquei, pois, a saber que Praga vai muito além do seu Castelo e do seu centro histórico. Praga é os seus pomposos jardins. Os seus acolhedores cafés afastados do centro. As suas conversas. É a forma como os seus habitantes valorizam uma chávena de café ou chá ao anoitecer. É uma cidade culturalmente instruída. E, com a devida modéstia, eu gostava muito de passar parte da minha vida assim... Na "Cidade das mil torres", tal como a Simona me disse.
Assim, caríssimas Simona e Ivana, só se eu morrer entretanto. Estou convicto que nos encontraremos novamente, na nossa "beautiful Praha"...

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

"Nada é mais inabitável do que um lugar onde se foi feliz."
(Cesare Pavese)
Curioso como estas palavras de Cesare Pavese causam em mim sentimentos contraditórios. Ora concordo em absoluto, ora discordo veementemente. Ao longo dos meus tenros 27 anos, tanto posso afirmar que "Pavese, és grande sim senhor!", ou "O que é tu estás pr'aí a dizer?".
Destarte, nasci, cresci e vivi toda a minha adolescência em Guimarães. Garanto-vos que, até aos meus 17, idade com que dei início à minha vida no ensino superior, fui um rapaz feliz. Entretanto, licenciei-me. Dei início à minha vida profissional a realizar um tirocínio em advocacia. Em que local? Guimarães certamente! No tal lugar onde havia sido feliz... E, em abono da verdade, vou discordar dos doutos escritos de Pavese neste capítulo. Regressei e não senti minimamente que a cidade berço se tenha tornado num local inabitável. Bem pelo contrário. Senti um certo choque por voltar a viver debaixo do mesmo tecto e sobre a alçada dos meus progenitores, é certo. Mas também nunca fui, propriamente, um adolescente "muito fácil" em casa. Quanto ao estágio, chega a ter tons de desesperante e as perspectivas de futuro são bastante negras, como já foi explicitado. Simplesmente, não acredito que este estado de coisas se alterasse significativamente caso eu resolvesse estagiar em Coimbra, no Porto ou Lisboa, ou em Freixo de Espada a Cinta... In casu, sinto-me neste meu regresso como alguém de que não tem razão de queixa. Vou vivendo e sinto-me útil, nem que seja para aqueles que me estão mais perto.
Mas é retrospectivando o meu percurso académico que encontro a veracidade nas palavras de Pavese. Concluí a minha licenciatura em Coimbra em Janeiro de 2005. Olhando para trás, tive os meus "anos loucos em Holywood"... Foi indescritível. Entendo, hoje, perfeitamente o alcance do provérbio "Coimbra é mãe e madasta". Então, voltei a Coimbra neste ano transacto onde realizei uma pós-graduação. Não mais encontrei aquela pérola do Mondego que outrora conheci... Desprovida daqueles tempos de irresponsabilidade, daqueles que nos marcaram, Coimbra tornou-se hoje para mim um local inabitável, que recordo com enorme nostalgia...
Concluo, dizendo que uma questão ainda se levanta. Pelo meio do meio percurso, habitei meio ano de Erasmus na Bélgica, na acolhedora cidade de Leuven, Louvain ou Lovaina (como preferirem). Foi o meio ano da minha vida e por enquanto fico-me por aqui. Mas a questão que se impõe é: Será Leuven também um local inabitável, esse local onde eu fui mesmo mesmo mesmo feliz? Será que algum dia responderei a isto?
Quem sabe...

INSTINTO DE SOBREVIVÊNCIA

Em meados de Agosto de 2005, seguia no meu 2º inter-rail pela costa da Bulgária, mais concretamente em Varna. Fazia-me acompanhar do meu amigo Giovanni, siciliano, a quem endereço desde já um saudoso abraço (amigo, oportunamente, traduzirei este post para siciliano para que o possas ler). Subitamente, enquanto nos dirigiamos para a praia num autocarro apinhado de gente, o meu amigo Giovanni foi categoricamente esbulhado no seu património por uma jovem búlgara de ar ternurento, que lhe subtraiu a carteira. Giovanni, homem de boa rés, sentiu profundamente no seu estado animico a densidade daquele acto criminoso. Uma tarde de incertezas quanto ao facto de ter sido roubo ou não, de confirmação de que, efectivamente, o roubo houvera sido uma realidade e de queixas numa esquadra de polícia em que a lingua inglesa era uma encantadora raridade, e o venire da inadiável decisão: do "fim da linha" na viagem do Giovanni, o "The End" anunciado da aventura sobre carris, como o final infeliz do soldado que não mais regressa a casa ou a separação dos amantes que em todo o filme indiciavam ficar juntos. Perante o sucedido, fui forçado a optar por entre 3 campos de decisão. A saber:
Primus- Igualaria formalmente a decisão do meu amigo e companheiro de viagem, regressando também eu a casa, a este paraíso à beira-mar plantado;
Secundus- Igualaria materialmente a decisão do Giovanni, regressando com ele a sua casa, repita-se, à Sicília, gozando do conforto que me poderia ser proporcionado nessa ilha que, até então, não conhecia;
Tertius- Continuava sozinho o inter-rail a partir do ponto em que me encontrava, até ao último dia de validade do meu bilhete, sendo que nunca tinha antes viajado sozinho, pelo menos a esta dimensão.
Resumindo, a escolha que me restava era simples: ora opto pelo conforto e não me chateio por aí além, ora opto por gozar o que restava das minhas férias a "sobreviver". A páginas tantas, talvez estranhamente, optei pela terceira das hipóteses. Então, dei 50 euros ao meu amigo Giovanni para que se alimentasse no seu regresso e dei continuidade áquela aventura sozinho. E decidi que a costa da Roménia seria o meu próximo destino. Assim, parti para Bucareste. Estava entregue ao mundo. O meu passaporte, o meu bilhete de comboio, os meus cartões multibanco e a minha mochila atolada de roupa eram os meus únicos e fieis amigos. Após um episódio mais ou menos dantesco dentro do comboio, ainda em Varna, em que por pouco não fiquei sem o bendito passaporte, fiz-me acompanhar, desta feita, por um persistente pensamento: "se sobreviver a isto, sobrevivo a tudo!". E ainda deambulava sobre esta máxima quando, já na Roménia, em direcção à costa, fui abordado dentro de um comboio por um sujeito. Fiquei a saber que ele era romeno. Fiquei a saber ainda que aquele indivíduo bebia imenso, que sofria de um desgosto amoroso e que havia sido abandonado. Fiquei a saber que aquele homem, que conheci por acaso, por mero fortuito, se dirigia para o mesmo sítio que eu para tentar pôr fim à vida. O homem era sinistro e assustador. Não acreditava que eu era advogado-estagiário e pediu-me que o provasse. Pediu-me os meus documentos, inclusive. Insultava tudo o que se cruzasse com ele naquele comboio, como se não houvesse amanhã. Disse-lhe que me ia encontrar com amigos que já me esperavam há 1 dia. O sujeito - e bem - não acreditou. E começou a insistir em vir comigo. E estava eu ali, a tentar sobreviver... E a ter de lidar com aquilo...
Por isso, comecei a desejar, realmente, que o dito homem se afundasse no Mar Negro... Não sei se o conseguiu, se não, mas a dinâmica ali presente foi perfeita: de um lado a sobrevivência, do outro a rendição. E se estou aqui a contar isto, então fui bem sucedido... Portanto, sou hoje um homem mais convicto. Porque, como ordena a máxima, "sobrevivi àquilo, logo sobrevivo a tudo o resto"...

INTRO - BREVES CONSIDERAÇÕES

Eram 3 da manhã de 11 de Setembro de 2008. A escolha da data, apesar da carga drasticamente simbólica do dia, foi completamente aleatória. Simplesmente, nesse momento apeteceu-me criar um blog. Assim o fiz. Sempre podia ter surgido uma ideia pior. Mas foi algo que, bem aproveitado, até pode ser instrutivo. Por conseguinte, apesar de já estar possuído por um sono infernal, escolhi um título, recolhi a imagem e virei e revirei esta até ao ajustamento actual. De seguida, elaborei a descrição do blog. O resultado, é o que na gíria se pode chamar de "aquela bela merda que podem vêr". Mas pouco importa. A ideia preponderante é a de que criei o meu próprio blog. Naquele determinado momento, quis criar um blog e assim o fiz. E este blog, inevitavelmente, já faz parte de mim. Por isso, em homenagem a essa criação do blog, a essa decisão do momento, decidi que o escopo deste blog fosse isso mesmo: aquilo que fiz em determinado momento, as decisões que tomei em certo tempo e as consequências que suportei por causa disso. É o chamado "fortuito" ou "acaso", que às vezes não parece ser nada e afinal é tudo. Ou seja, a "páginas tantas" aconteceu "isto e aquilo" e, por isso, hoje as coisas são assim. E é por falarmos do momento que o pano de fundo deste blog é negro. Porque os meus desafios próximos impõem-me que veja o futuro desta cor. Resta-me, pois, dar ouvidos aos Radio Macau e "tentar mandar pintá-lo, em tons de azul"...
A ver vamos...